No dia anterior, moeda americana disparou 2,82% e encerrou o dia cotada a R$ 6,26, maior valor da história. O Ibovespa, principal índice acionário da bolsa, caiu 3,15%. 'A gente sabe que há um problema fiscal', diz Daniel Sousa sobre alta do dólar
Após bater recorde de R$ 6,30 por volta das 10h10 desta quinta-feira (19), o dólar passou a operar em queda, a R$ 6,10. A redução do valor da moeda americana só foi possível graças a dois leilões de dólar realizados pelo Banco Central do Brasil (BC) para aumentar a oferta da moeda no país e conter a desvalorização do real.
O primeiro leilão, por volta das 9h30, vendeu US$ 3 bilhões, mas não foi suficiente para conter a alta. O BC, então, anunciou um segundo leilão, de mais US$ 5 bilhões, para as 10h35. Pouco antes de 12h, a moeda americana passou a operar abaixo dos R$ 6,20.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, avaliou que houve uma saída extraordinária de recursos do país neste fim de ano, por isso a instituição resolveu intervir com leilões de venda de dólares. O futuro presidente da instituição, Gabriel Galípolo, disse não ver "ataque especulativo" contra o real.
O foco do mercado segue no cenário fiscal. Na quarta-feira, o relator de um dos projetos do pacote de corte de gastos do governo federal na Câmara dos Deputados apresentou seus pareceres para que os textos sejam votados na Casa.
O problema é que houve uma "desidratação" de algumas medidas — ou seja, amenizou alguns pontos no texto que podem resultar em uma contenção das despesas públicas menor que o esperado. (veja os detalhes mais abaixo)
Já na tarde desta quinta, foi aprovado em primeiro turno o texto-base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria novas regras para o abono salarial e prorroga a desvinculação de receitas da União, que libera recursos antes alocados em determinadas áreas. (leia também mais abaixo)
Investidores acompanham de perto o desenrolar das propostas que compõem o pacote de corte de gastos e há um temor de que as medidas anunciadas não sejam suficientes para equilibrar as contas públicas e conter o avanço das despesas do governo.
Há expectativas de novas votações nesta quinta.
Além do cenário fiscal, o mercado repercute, também, o relatório de inflação do BC. A instituição admitiu oficialmente que a meta de inflação, em 2024, será descumprida novamente, pelo terceiro ano seguido.
A meta para 2024 era de 3% e poderia oscilar entre 1,50% e 4,50% para ser considerada formalmente cumprida.
Veja abaixo o resumo dos mercados.
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Dólar
Às 15h54, o dólar caía 2,48%, cotado a R$ 6,1115. Na máxima do dia, porém, chegou a R$ 6,3000. Veja mais cotações.
Na véspera, a moeda norte-americana subiu 2,82%, cotada a R$ 6,2672.
Com o resultado, acumulou:
ganhos de 3,85% na semana;
alta de 4,44% no mês;
avanço de 29,15% no ano.

Ibovespa
No mesmo horário, o Ibovespa subia 0,53%, aos 121.417 pontos.
Na véspera, o índice caiu 3,15%, aos 120.772 pontos.
Com o resultado, acumulou:
queda de 3,08% na semana;
perda de 3,90% no mês;
recuo de 10% no ano.
Entenda o que faz o preço do dólar subir ou cair
O que está mexendo com os mercados?
O pacote de corte de gastos proposto pelo governo federal continua andando no Congresso. A ideia é economizar R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, e um total de R$ 375 bilhões até 2030.
Na tarde desta quinta, a Câmara dos Deputados aprovou, em 1º turno, o texto-base da PEC que cria novas regras para o abono salarial e prorroga a desvinculação de receitas da União, que libera recursos antes alocados em determinadas áreas.
Por se tratar de uma sugestão de mudança à Constituição, a PEC ainda precisa ser submetida a um 2º turno de análise, onde são necessários, no mínimo, 308 votos favoráveis.
Antes disso, porém, os deputados ainda votarão os chamados destaques — sugestões de mudança ao texto original. Encerradas as duas etapas, a PEC poderá seguir para análise do Senado.
Após negociações, o relator da PEC, deputado Moses Rodrigues (União-CE), desidratou parte das medidas previstas no texto. Na prática, isso diminui o tamanho do corte de gastos que será obtido.
Na quarta-feira (18), o relator de outro projeto do pacote de corte de gastos enviado pelo governo, deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), apresentou seu parecer e manteve o limite proposto pelo governo na alta do salário mínimo.
A proposta seria votada na noite de quarta, mas, por risco de falta de quórum, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), passou a votação para esta quinta, o que ainda não aconteceu.
Em seu parecer, o relator também amenizou regras inicialmente previstas pelos governo na concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e excluiu mudanças no reajuste do Fundo Constitucional do Distrito Federal. São alterações que também desidratam o texto e tendem a afetar o efeito do corte.
Antes, na terça-feira, as primeiras medidas já tinham sido aprovadas pelos parlamentares: a Câmara dos Deputados aprovou o texto que proíbe a ampliação de benefícios tributários quando as contas públicas tiverem um desempenho negativo.
Além disso, quando o governo registrar déficit primário (situação em que as despesas são maiores que o dinheiro arrecadado), a proposta aprovada ativa um "gatilho" que limita o aumento de gastos do governo com pessoal.
O governo precisa reduzir os gastos porque tem uma meta de zerar o déficit público pelos próximos dois anos — ou seja, gastar o mesmo tanto que arrecada em 2024 e 2025. O arcabouço também estipula que o governo deve começar a arrecadar mais do que gasta a partir de 2026, para controlar o endividamento público.
Mas os agentes financeiros já não esperam grande eficácia das medidas para controlar o endividamento público, e declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Fantástico consolidaram a percepção de que o governo não pretende avançar muito na contenção de despesas.
O mercado tinha a expectativa de que o governo mexesse em gastos estruturais nesse pacote de corte de gastos — como a Previdência, benefícios reajustados pelo salário mínimo e os pisos de investimento em saúde e educação. Mas isso não aconteceu.
Segundo os analistas, essas despesas tendem a subir em velocidade acelerada e têm potencial de anular esse esforço do pacote em pouco tempo. O governo, contudo, é avesso às medidas, que mexeriam com políticas públicas e com promessas de campanha do presidente Lula.
Segundo o blog do Valdo Cruz, interlocutores do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avaliam que o governo precisa dar uma sinalização mais forte na área fiscal, incluindo o anúncio de medidas adicionais às já anunciadas, para reverter de vez o cenário negativo que reina no mercado neste fim de ano.
Os aliados de Haddad acreditam que a aprovação do pacote já enviado ao Congresso vai ajudar a acalmar os ânimos dos investidores, mas as medidas não serão suficientes para derrubar o dólar.
Reflexos da decisão do Fed
Os mercados interno e externo ainda repercutem o resultado da reunião do Fed, nesta quarta, que decidiu cortar os juros do país em 0,25 ponto percentual, para a faixa de 4,25% a 4,50% ao ano. A decisão veio em linha com as expectativas, mas não foi unânime.
Esse foi o terceiro corte seguido da taxa. Na reunião de novembro, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) reduziu o referencial na mesma proporção, em 0,25 p.p., enquanto na reunião de setembro o corte foi de 0,50 ponto.
Em nota, o Fomc afirma que os indicadores econômicos dos EUA sugerem que a atividade econômica do país continuou a se expandir em ritmo sólido, mas com os riscos controlados.
"Desde o início do ano, as condições do mercado de trabalho se suavizaram, e a taxa de desemprego aumentou, mas permanece baixa. A inflação avançou em direção à meta de 2% do Comitê, mas ainda está um pouco elevada", diz o texto.
Essa foi a segunda reunião do Fomc após as eleições presidenciais norte-americanas, que voltaram a colocar o republicano Donald Trump como chefe de Estado da maior economia do mundo.
A nota do Fomc diz ainda que o comitê julga que os riscos para atingir suas metas de emprego e inflação estão aproximadamente equilibrados, mas que as perspectivas econômicas são incertas, e o Comitê está atento aos riscos.
"O Comitê estará preparado para ajustar a postura da política monetária, conforme apropriado, caso surjam riscos que possam impedir o alcance das metas do Comitê", diz.
Diante desse cenário, a leitura é de que a incerteza sobre quais serão os efeitos da gestão de Trump na economia dos Estados Unidos também podem afetar as decisões do Fed à frente.
A eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos já era precificada pelo mercado, mas aumentou as preocupações sobre os efeitos da agenda econômica conservadora e protecionista que o republicano deve carregar durante seu mandato.
Essas medidas são vistas como inflacionárias pelo mercado e podem — além de trazer impactos para a economia de outros países — obrigar o Fed a manter os juros elevados para conter um eventual aumento de preços.
Juros menores nos Estados Unidos podem ser positivos para o Brasil. Isso porque, com taxas menores, os títulos públicos do país (considerados os mais seguros do mundo) passam a entregar uma rentabilidade também menor.
Cédulas de dólar
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